terça-feira, 27 de agosto de 1985

Um novo candidato (2)

Laranjinha perante a situação internacional
 
Quisemos saber as posições do nosso Candidato Isolindo Laranjinha, de Campolide, perante o panorama perturbador dos assuntos internacionais, (e aqui, nunca será de mais evocar a correctíssima e lúcida opinião de Laranjinha expressa a este jornal no auge da crise petrolífera, ao propor substituir o petróleo por briquetes; como teria sido fácil para nós superar a crise energética se esses engenheiros novatos soubessem o que eram briquetes — baratas e nunca falhavam...)
 
Questionei pois Laranjinha sobre o que ele pensa da atitude portuguesa perante a insistência do presidente Reagan na nossa participação na chamada «Guerra das Estrelas».
 
L. — «Eu, em primeiro lugar devo dizer que vou pouco ao cinema mas lembro-me duma Fita com esse Reagan e um macaco que era de cagar a rir. Deve ser um bom presidente. Quanto a isso da Guerra das Estrelas também vi, no Promotora, parece-me. Gostei. É claro que para nós fica caro entrar naquelas coisas. Gostei dos efeitos especiais e da Princesa Lala ou Laila ou lá o que era o nome não interessa — o que era uma pêssega, mas uma destas pêssegas, meu amigo! Que eu sei bem que estas coisas já não são muito para a minha idade, até só pensar nelas, mas apesar de viúvo e de respeitar muito a memória da minha Adosinda, um homem não é de pau, não é?
E havia o boneco baixinho que era rabote ou rebite ou uma coisa assim. Bem giro. Uma coisa daquelas é que me fazia arranjo ensinado a servir os fregueses...»
J.P.B. — «Presidente (deixe-me chamá-lo já assim!), não é bem isso. É coisa à séria, guerra mesmo com foguetões atómicos no espaço supra-atmosférico circunterrestre, etc.»
L. — «Então aí a gente já pode fazer qualquer coisa. O Teixeira e Filhos, de Freamunde ou os de Lanhelas fazem um fogo preso e de subir que é uma maravilha, nem o Reagan nunca viu assim. Tem então um que acaba com um boneco que estoira todo e sai uma girândola de morteiros que só visto. Aí sim, aí a gente pode comprometer-se. Não pode é ser em Campolide, tem que ser no Tejo ou na serra de Monsanto com os bombeiros a postos por causa do fogo, que sempre é um perigo. Agora isso atómico cá não entra. Nem em Campolide nem no País. Nem na província. Sei lá se isso dos atómicos estraga as vinhas?! Você já viu o prejuízo que pode ser?»
J.P.B. — «Mas presidente Laranjinha, a questão é outra, é geoestratégica, está em jogo a atitude do bloco dito oriental, enfim, o chamado bloco do Pacto de Varsóvia... Trata-se mesmo de guerra a sério, em potência...»
L. — «Isso é que não. Isso, já dizia o meu avô — Jogos de mãos, jogos de vilões — alguém acaba por se magoar com isso. É a merda do costume, bum! Bombas, tiros, gente morta, casas destruídas, vinhas todas estragadas, é só prejuízo.
Comigo não. Guerra, comigo não. Em sendo presidente mando logo pôr um letreiro na fronteira assim «proibido fazer guerra dentro deste País. Quem quiser fazer guerra faça favor de ir fazê-la lá para a terra donde veio, que isto aqui não é o da Joana»
J.P.B. — «E a nossa presença actuante junto dos grandes conflitos mundiais...»
L. — «De conflitos, percebo eu, com um estabelecimento como este. É sempre a mesma coisa, eu nisto tenho muita experiência. É só falta de almoçar bem. P. Ex.° esse Khomeiny e o outro filho da puta como ele que andam há que tempos à porrada lá na terra do petróleo, é como o Silvinha tipógrafo e o Joãozinho gago andavam — dei-lhes um almoço de chispalhada com feijão e febras de porco na brasa, fizeram logo as pazes.»
J.P.B. — «Mas são muçulmanos, sabe, não podem comer carne de porco...»
L. — «Ah! é? então é bem feito, que se lixem. Quando um dia mudarem de ideias, venham comer a minha chispalhada como eu a faço e febrazinhas assadas ao ar livre nos terraços de Belém, acabasse-lhe logo a vontade de andar à guerra».
J.P.B. — «E a Nicarágua? e o Salvador?»
L. — «São muitos?»
J.P.B. — «São vários milhões deles...»
L. — «Não dá para virem cá a Belém.»
J. P.B. — «Não »
L. — «Bem, se calhar o melhor era eu ir fazer lá mesmo a feijoada e as febras, levava-se daqui o preciso. Vinho tinto forte, da Lagoa ou da Vidigueira. Isso arranja-se, o que é preciso é boa vontade.
J.P.B. — «E aos povos famintos da Etiópia, do Sudão, do Bangladesh...
L. — «Esses que se veem na televisão? Esses não aguentavam chispe e febras, coitados — a esses eu fazia uma canjazita, um peixinho cozido com grelos, coisas assim leves. Mas não se engane o problema ali é outro, não vai lá com umas ajudazitas, ali querem-se grandes mudanças, grandes reformas.
Mas eu não posso ser presidente deles não é?
Eu cá resolvia aquilo tudo. É fazer como fez o João Magrezas nas terras dele que são ao lado das minhas lá na província. Um dia destes eu explico-lhe. É preciso é que eles lá tenham correios. Eles têm correio ou telégrafo, lá nessas terras? Têm. Então um dia eu explico-lhe.»